Por Juliana Oliveira
Antes de tudo, preciso deixar algumas observações: como grande fã do ator Jake Gyllenhaal (desde o filme “O Dia Depois de Amanha” de 2004), tenho que dizer que “O Abutre”, com certeza foi uma das suas melhores atuações. Não somente pelo seu talento, mas pelas transformações físicas que enfrentou durante o processo de gravação. O filme de 2014 possui cerca de 1h50min, e é dirigido por Dan Gilroy, o mesmo de “Gigantes de Aço” (2001) e “Tudo por Dinheiro” (2005). Gilroy e Gyllenhaal demonstram um entrosamento incrível com relação à história, conseguindo construir uma narrativa de suspense que envolve o espectador e, é claro, com um final que não é clichê. E vou confessar: um pouco revoltante.
Este post pode conter alguns spoilers, mas não perca a oportunidade de assistir a esse filme, que inclusive já está disponível no Netflix. Fiquem tranquilos! Não revelarei o final do filme. Só se você for curioso e procurar na internet, antes mesmo de terminar de ler esse texto. Ninguém merece aqueles amiguinhos que contam quem morrerá e como isso vai acontecer, né? (Abraços, Game of Thrones).
Somos capazes de muita coisa. Mas o que faríamos para conseguir subir na vida, ultrapassando tudo e todos? É isso que o filme “Nightcrawler”, ou “O Abutre”, mostra: os limites morais e éticos da mídia e até onde a individualidade e frieza humana podem chegar, e quando a obsessão por determinada coisa afeta nossas atitudes. O próprio nome do filme em português foi uma boa escolha, pois, o animal abutre nada mais é do que uma ave com hábitos necrófagos, que é uma boa descrição para o personagem principal.
Lou Bloom (Jake Gyllenhaal) é uma pessoa totalmente solitária e sem expectativas. Magro, com olhos arregalados e cabelos oleosos que demonstram uma aparência amigável, porém, possui sorrisos e expressões vazias. Lou usa a internet para conhecer e aprender sobre diversos assuntos, mas não consegue manter muitos relacionamentos. Suas falas, sempre irônicas ou monólogos, parecem emergir de uma personalidade problemática. Sobrevive de pequenos furtos e crimes, mas suas ambições são maiores. Tudo muda quando Lou presencia um acidente de carro e percebe que diversos reportes free lances chegaram ao redor e começaram a filmar ao meio dos bombeiros e policiais, sem dar muita importância ao estado de saúde da vítima.
Descobre então que o jornalismo sensacionalista (ao extremo, diga-se de passagem), está se tornando um mercado lucrativo em Los Angeles. Juntando o dinheiro, Lou compra uma câmera e começa a trabalhar como cinegrafista independente, filmando cenas de crimes, acidentes e até assassinatos. Contudo, conhece o noticiário “KWLA NEWS”, editado por Nina (Rene Russo), alimentando-o com seus vídeos, que de principio eram totalmente amadores.
A rotina de filmagens acontece durante as noites perigosas da cidade e Lou começa a aprimorar suas técnicas de gravação. Para conseguir exclusividades em informações, ouve as frequências policiais e “contrata” um jovem para ser seu estagiário. Depois de perceber que há concorrências que ameaçam sua função, deixa de apenas filmar e começa a produzi-las, alterando cenas de crimes e acidentes, tornando a narrativa dramática da situação em algo extremamente valioso para o sensacionalismo.
Nina, possui ambições parecidas com Lou, mesmo percebendo a estratégia doentia dele, não hesita em incentivá-lo com relação as filmagens, pois fatura audiência e reconhecimento através disso. Lou, por sua vez, não hesita também em misturar contato profissional com pessoal, se envolvendo com Nina, e mesmo o sentimento não sendo recíproco ameaça a boicotar a parceria com o canal e aumentar o preço dos vídeos e a exclusividade que possuía.
Lou ganha reconhecimento quando presencia um atentado à uma família de classe alta, onde os moradores foram assassinados de forma suspeita.
Melhor parar por aqui. Mas gostaria de salientar que apesar do filme ter um ar sombrio, assim como o personagem principal, a narração é bem legível e compreensível, diferente de alguns filmes do Gyllenhaal. Ah, outra coisa: se você não curte o estilo de “filmes parados” creio que terá uma opinião completamente diferente da minha, mas tenho certeza de que você ficará atento até o final. Assim como Lou diz: “Um bom quadro não apenas conduz o olhar para a imagem, ele o mantém lá por mais tempo”, creio que essa é a mensagem que caracterizam alguns aspectos do filme, como a obsessão de Lou por coisas que afetam aos outros e não a ele. Mostrando que a individualidade do personagem existe, porém o que alimenta sua personalidade são fatores muito maiores. Dessa forma, acho que não é somente sobre o quão grandioso poderia ser o personagem, e sim mostrar como as obsessões do mesmo tornaram-se algo natural, levando-o para um caminho que talvez ele julgasse certo. Os detalhes, como seu trabalho em mostrar o rosto das vítimas, sua superioridade e até mesmo o modo como manipula e convive com as pessoas. Talvez suas atitudes, ou até mesmo a situação que causa com seu “estagiário”, mostra que a expressividade do mesmo só estava começando a aparecer, de forma que, a natureza humana além de tudo é capaz de ultrapassar valores para conseguir algo que seja de seu interesse, provando que a intenção desde o começo era apenas de benefício próprio, deixando o restante para trás.