Sob o tema “Comunicação e Superação da Violência”, Vigário Episcopal para o Povo de Rua da Arquidiocese de São Paulo conversou com alunos da FAPCOM e foi aclamado por eles
por Wagner Belmonte*
A Aula Magna do Padre Júlio Lancellotti, na noite de ontem, 20/03, é um dos grandes momentos da história que a FAPCOM tem escrito como instituição que prima pela excelência, amparada por sólida visão social. O encontro pôde suscitar uma série de reflexões a quem o acompanhou atentamente, com esperança e brilhos nos olhos. Além de falar sobre comunicação e violência, o Padre Júlio foi enfático ao sugerir aos estudantes que eles contestem mais, resistam mais e só assim “teremos os caminhos para uma transformação mais efetiva”.
MARIELLE – Antes da abertura da Aula Magna, as alunas – Alyne Cristine (Jornalismo) e Leila Evelyn (Relações Públicas) – organizaram uma bela homenagem à vereadora do PSOL-RJ assassinada há uma semana. Elas mostraram que a violência contra os negros na periferia das grandes cidades é uma realidade e que o País precisa olhar para isso porque o preconceito racial está vivo e faz novas vítimas. Alyne citou que “a cada cinco dias, um caso de injúria racial é registrado nas universidades”.
Logo na abertura de sua explanação, o Padre Júlio demonstrou preocupação com o crescimento da população de rua, aqui e no exterior. Ele pontuou que esse aumento está associado ao cenário de desigualdade e que “são 20 mil moradores de rua em Washington, 60 mil em Nova York e 40 mil em Los Angeles; apenas a cidade de Lisboa, na Europa, não registrou crescimento no número (de moradores de rua)”.
Os dados permitiram uma associação e contextualização com a realidade das ruas em meio à violência e, assim, foi possível construir um debate sobre o papel da comunicação neste sentido. A nossa luta, disse Lancellotti, é “para superar a violência num sistema violento”, enfatizou. Segundo ele, “não se supera (a violência) sem liberdade, sem autonomia”.
Ainda em meio a uma explicação pontual sobre a violência contra moradores de rua, Padre Júlio citou que o direito deles à cidadania não viceja e provocou: “como essa pessoa vai superar uma situação de violência, se todos os dias ela ouve: ‘Ô, lixo’”, num processo contínuo de exclusão, ofensas e agressões. Ele foi bastante aplaudido quando afirmou que “o duro na vida é saber que a nossa luta é uma luta inglória. Quem está ao lado dos odiados será odiado também”.
Em seguida, Padre Júlio se dirigiu ao jovem, a quem está na faculdade e vê um cenário político de ceticismo no Brasil de hoje. “Temos de buscar brechas para não perder a esperança. Façam barulho. Rebelem-se. Contestem. Não fiquem calados. Não aceitem tudo pronto”, disse, reproduzindo algumas das recomendações que o Papa Francisco fez à juventude. “Vivemos um momento de um individualismo assustador, exacerbado. Precisamos que não haja conformismo, que vocês não deixem de se indignar porque, como dizia Paulo Freire, a cabeça do opressor é a hospedaria dos oprimidos”.
Depois da palestra, que durou cerca de 50 minutos, os alunos tiveram a oportunidade de fazer perguntas ao Padre Júlio. Surgiram assuntos que envolviam da política nacional e do caso Marielle Franco à comunicação. Padre Júlio foi cirúrgico: “Nós não gostamos de comunicar a fragilidade, mesmo na tempestade. Isso é ter medo do amor. Como comunicar a dignidade da vida e a defesa dos fracos?”, questionou.
No que diz respeito ao momento histórico, Padre Júlio voltou a pedir que os jovens tenham garra, lutem e não desanimem. Ele propôs uma reflexão também aos cristãos: “é assustador ver católicos e evangélicos defendendo a pena de morte”. Por fim, sugeriu aos estudantes e aos professores “que trabalhem o texto do Papa Francisco sobre o Dia Mundial da Comunicação, texto muito importante numa época de Fake News”.
Padre Júlio: “O que mais me causa tristeza é ver a opressão contra os irmãos de rua”.
*Prof. Wagner Belmonte é professor da FAPCOM